Não me lembro de, em qualquer outra época, eu ter sentido realmente medo do dia de amanhã. Verdade, outras crises já assombraram o nosso país mas eu nunca as senti (se tempos complicados existiram, eu – no conforto da casa dos pais – nunca antes dei por eles). Hoje é diferente. Tenho contas para pagar e um frigorífico para manter composto e uma cadela para alimentar e um carro para abastecer e sei lá que mais. Eu, novamente desempregada e sem quaisquer perspectivas de trabalho, estou verdadeiramente preocupada com o que aí vem e é por isso que não consigo conceber que os portugueses (aqueles, sabem, que estão lixados com o FMI?) esgotem os hotéis algarvios por estes dias. Eu sei, quem tem dinheiro faz o que quer com ele e se as pessoas querem comer amêndoas no Algarve é lá com elas. Mas, porra, isto está assustadoramente perigoso para qualquer um, não só para os pobres e desempregados. Veja-se o exemplo da Irlanda… Não são apenas os pobres que estão a sentir a crise, é toda uma classe média alta que, após anos de vida acima das possibilidades, vê-se agora a braços com o desemprego, com a obrigatoriedade de vender grande parte dos bens e com a realidade de que férias, nos próximos tempos, só em sonhos. E, verdade seja dita, quem sempre viveu com o dinheiro contado está calejado. Os ricos é que não estão preparados para perder o que sempre tiveram e é por isso que levam mais tempo em estado de negação perante momentos difíceis, continuando a gastar como se nada se passasse.
No dia em que o FMI aterrou, literalmente, em solo luso, vi uma reportagem em que uma turista holandesa (se a memória não me falha) se mostrava escandalizada com o facto de Portugal estar na bancarrota mas as pessoas almoçarem em restaurantes. Dizia ela: “nós levamos uma sanduiche de casa para comer à hora de almoço, é uma forma de poupar”. Eu não sei se levar a marmita com o almoço para o trabalho seria a solução porque, bem sabemos, o cerne da questão está na mentalidade do português. Pode estar tudo desgraçado mas, seja de que forma for, não pode é faltar dinheiro para ir ao restaurante, à bola e para outros tantos luxos. Basta ver a quantidade de carros novos que rodam por aí ou dar uma vista de olhos nos sites das operadoras móveis – onde podemos ver que os equipamentos mais vendidos são os topo de gama.
Os portugueses gostam de ignorar os problemas até à última, gostam de esticar a corda para ver até onde ela aguenta. Acho que sobeja aquela ideia de que se ignorarmos as coisas, elas deixam de existir (como a morte ou as doenças, há pessoas que pensam que se não falarmos nisso, elas deixam de acontecer). “O FMI? Quero lá saber, deixa-me lá ir ali gastar 1000 euros em quatro dias de férias e que se lixe o FMI, que eles ainda nem decidiram quanto nos vão emprestar.” Custa-me um bocado a perceber mas esse é um problema meu, de facto.
Haja malta optimista que consegue ir comer o folar com os pés na areia, que eu cá nem para ir acampar teria possibilidades neste momento. Até porque não tenho tenda e se há coisa que me dá urticária é o campo e aqueles répteis fofinhos que andam lá no meio das ervas.