quinta-feira, 21 de abril de 2011

De como os portugueses são corajosos

Não me lembro de, em qualquer outra época, eu ter sentido realmente medo do dia de amanhã. Verdade, outras crises já assombraram o nosso país mas eu nunca as senti (se tempos complicados existiram, eu – no conforto da casa dos pais – nunca antes dei por eles). Hoje é diferente. Tenho contas para pagar e um frigorífico para manter composto e uma cadela para alimentar e um carro para abastecer e sei lá que mais. Eu, novamente desempregada e sem quaisquer perspectivas de trabalho, estou verdadeiramente preocupada com o que aí vem e é por isso que não consigo conceber que os portugueses (aqueles, sabem, que estão lixados com o FMI?) esgotem os hotéis algarvios por estes dias. Eu sei, quem tem dinheiro faz o que quer com ele e se as pessoas querem comer amêndoas no Algarve é lá com elas. Mas, porra, isto está assustadoramente perigoso para qualquer um, não só para os pobres e desempregados. Veja-se o exemplo da Irlanda… Não são apenas os pobres que estão a sentir a crise, é toda uma classe média alta que, após anos de vida acima das possibilidades, vê-se agora a braços com o desemprego, com a obrigatoriedade de vender grande parte dos bens e com a realidade de que férias, nos próximos tempos, só em sonhos. E, verdade seja dita, quem sempre viveu com o dinheiro contado está calejado. Os ricos é que não estão preparados para perder o que sempre tiveram e é por isso que levam mais tempo em estado de negação perante momentos difíceis, continuando a gastar como se nada se passasse.
No dia em que o FMI aterrou, literalmente, em solo luso, vi uma reportagem em que uma turista holandesa (se a memória não me falha) se mostrava escandalizada com o facto de Portugal estar na bancarrota mas as pessoas almoçarem em restaurantes. Dizia ela: “nós levamos uma sanduiche de casa para comer à hora de almoço, é uma forma de poupar”. Eu não sei se levar a marmita com o almoço para o trabalho seria a solução porque, bem sabemos, o cerne da questão está na mentalidade do português. Pode estar tudo desgraçado mas, seja de que forma for, não pode é faltar dinheiro para ir ao restaurante, à bola e para outros tantos luxos. Basta ver a quantidade de carros novos que rodam por aí ou dar uma vista de olhos nos sites das operadoras móveis – onde podemos ver que os equipamentos mais vendidos são os topo de gama.
Os portugueses gostam de ignorar os problemas até à última, gostam de esticar a corda para ver até onde ela aguenta. Acho que sobeja aquela ideia de que se ignorarmos as coisas, elas deixam de existir (como a morte ou as doenças, há pessoas que pensam que se não falarmos nisso, elas deixam de acontecer). “O FMI? Quero lá saber, deixa-me lá ir ali gastar 1000 euros em quatro dias de férias e que se lixe o FMI, que eles ainda nem decidiram quanto nos vão emprestar.” Custa-me um bocado a perceber mas esse é um problema meu, de facto.
Haja malta optimista que consegue ir comer o folar com os pés na areia, que eu cá nem para ir acampar teria possibilidades neste momento. Até porque não tenho tenda e se há coisa que me dá urticária é o campo e aqueles répteis fofinhos que andam lá no meio das ervas.

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